quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Um conto: Menos razão e mais amor, por favor

Anita estava sozinha andando pela calçada quando avisou Artur. Ela realmente avistou, ela não viu, olhou ou encarou. Artur estava distraído, era moreno, tinha uma barba rala, um andar despojado e despreocupado.

Anita desviou o olhar e, mirando o chão, ficou a imaginar o que fazia aquele moreno vestindo aquela calça jeans preta e camisa xadresa (ela, julgando, pensou: quem usa camisa xadresa de maneira tão imponente?). Ela ficou pensando na provável profissão dele. Seria publicitário? Jornalista? Redator de Blog ou programador de software?

Um riso bobo surgiu no rosto de Anita enquanto pensava. Como podia pensar tanta bobagem, se recriminou. Como podia a mente viajar assim? Quanta maluquice! Ela continuava andando e, olhando para frente, viu ele, do outro lado da rua, vindo quase na sua direção. Desviou o olhar novamente e fixou-o nos carros, foi quando avistou a sinaleira. Entre eles, uma sinaleira. Iria ele atravessar a rua na mesma sinaleira que ela?

E se fosse o destino, o acaso ou Deus que estivesse providenciando um encontro desses? Será que ele gostava de ler como ela? Tinha jeito de leitor assíduo... Ou, seria sua pura e boba imaginação? Bobagem! Quase tropeçou e foi salva por um senhor que, passando, segurou o braço dela e os quase 20 livros que segurava pesadamente em volta dos dois antebraços. Se fazia tempo que estava sozinha? Era mais fácil perguntar quanto tempo esteve com alguém! Ao menos o tempo era contado em dias e não por anos!

Não que Anita fosse feia ou que não tivesse atrativos, tão pouco era esquisita e não sabia se portar e conversar. Ela sempre tinha assunto, conhecia de tudo um pouco, lia muitos livros, via Discovery Chanel, estudava bastante. Seu pai, astrólogo, lhe ensinou o gosto pelas coisas vistas e não vistas. Sua mãe, oceanógrafa, lhe mostrou o gosto pela natureza e pela plenitude do Mundo embaixo de nós, fora da Terra. Talvez tenha sido por isso que Anita sempre pensou demais e deixou seus sentimentos guardados em uma caixinha que ela nem sequer teve acesso à chave.

Anita estava chegando na sinaleira e deu graças a Deus quando viu o sinal fechar para os pedestres. Teria mais tempo para entreolhar em volta e procurar Artur. E, atrás de um carro vermelho, um táxi e quase desaparecendo entre outros, lá estava ele caminhando ainda. Parou no sinal do outro lado da rua? Ela quase não conseguia ver. O trânsito parou e um ônibus agora estava em cima da faixa amarela. Nesse momento o sinal de pedestres ficou verde e o coração dela apertou. Cadê ele?

Um frio no estômago paralisou suas pernas e elas estancaram antes do meio-fio. Ela não via ele andar em frente e ela não queria sair do lugar sem ter a certeza que ao menos poderia passar por ele, próxima e trocar um olhar. Afinal, qual era a cor dos olhos dele? Ela nem tinha conseguido ver. Que boba. Como não percebeu esse detalhe tão importante. Um homem passou por ela rápido e quase derrubou os seus livros, então ela percebeu que precisava caminhar.

Primeiro passo para a rua e nada do Artur. Olhou em volta, muita gente andando para um lado e para o outro, mas nada de avistar aquela camisa xadreza, a calça preta e a barba rala. Se destraiu um pouco olhando as roupas das pessoas que passavam e não conseguiu identificar a figura que tanto havia lhe chamado a atenção há 03 minutos atrás.

Andando devagar, após atravessar a rua sem avistar o Artur, Anita propositalmente começou a olhar em volta, não desesperada, mas atenta, procurando, buscando, aprofundando o olhar até o outro lado da rua, até a outra quadra. Nada de enxergar ele. Nada de ver as características dele em ninguém.

E foi assim, sem encontrar, conversar e conhecer Artur, que Anita continuou na sua amizade de monólogos com seu cérebro, sem amor, mas com muita imaginação e sonhos.





Você já fez amizades assim? Amizades solitárias consigo mesma? Qual é o sonho que está guardado só para você? Se você não dividir com alguém pode ser que ele nunca saia do papel, nunca vire um projeto. Pode ser que aquele desejo só esteja esperando uma oportunidade para sair do seu cérebro e se tornar algo maior, concreto e possível. 

Coloca amor, que dá certo!
Mais amor, por favor!

Autora: Jorgete Rain

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